27 de set. de 2010

As consequências de um voto comprado

 Tempo de eleições, tempo que deveria ser para a conscientização do povo, tempo para conhecer realmente a função do político.Tempo de nos perguntar o porquê de votar no Sr.Sicrano ou Sr.Beltrano. No entanto, o que vemos é um abuso de cores, o aspecto visual se torna mais atraente e nos faz esquecer deliberadamente de saber detalhes sobre o candidato e suas propostas. Deveríamos ser obrigados pela nossa consciência a conhecer minuciosamente o plano de governo do candidato, sua experiência de vida relacionada à política.
Às vezes, só vemos no político sua maquiagem, sua imagem melhorada com planos mirabolantes, que sabemos serem impossíveis concretizá-los. Também não exigimos nada dele, nenhum preparo, nenhuma qualificação. Damos a ele através do nosso sagrado voto, o poder de legislar, governar.
Pior é que nem sabemos se possui a famosa ficha limpa, pois na propaganda política nem seu nome precisa usar, sendo assim, podemos votar no Tiririu, no Tonhão, no Galinha, no Dotô, no Mandioca, no Leitão, no Cara de  Pau, e assim vão desviando-nos de uma séria e necessária apresentação.
Nosso voto deve ser livre e consciente.

Raquel de Queiroz e sua consciência político-social.
Texto que segue foi escrito em 1947 , com ortografia original da época(Fonte:Memória Viva-O Cruzeiro)
“Não sei se vocês têm meditado como devem no funcionamento do complexo maquinismo político que se chama govêrno democrático, ou govêrno do povo. Em política a gente se desabitua de tomar as palavras no seu sentido imediato. No entanto, talvez não exista, mais do que  esta, expressão nenhuma nas línguas vivas que deva ser tomada no seu sentido mais literal: govêrno do povo. Porque, numa democracia, o ato de votar representa o ato de FAZER O GOVÊRNO.
Pelo voto não se serve a um amigo, não se combate um inimigo, não se presta ato de obediência a um chefe, não se satisfaz uma simpatia. Pelo voto a gente escolhe, de maneira definitiva e irrecorrível, o indivíduo ou grupo de indivíduos que nos vão governar por determinado prazo de tempo.
Escolhem-se pelo voto aquêles que vão modificar as leis velhas e fazer leis novas - e quão profundamente nos interessa essa manufatura de leis! A lei nos pode dar e nos pode tirar tudo, até o ar que se respira e a luz que nos alumia, até os sete palmos de terra da derradeira moradia.
Escolhemos igualmente pelo voto aquêles que nos vão cobrar impostos e, pior ainda, aquêles que irão estipular a quantidade dêsses impostos. Vejam como é grave a escolha dêsses “cobradores”. Uma vez lá em cima podem nos arrastar à penúria, nos chupar a última gôta de sangue do corpo, nos arrancar o último vintém do bôlso.
E, por falar em dinheiro, pelo voto escolhem-se não só aquêles que vão receber, guardar e gerir a fazenda pública, mas também se escolhem aquêles que vão “fabricar” o dinheiro. Esta é uma das missões mais delicadas que os votantes confiam aos seus escolhidos. Pois se a função emissora cai em mãos desonestas, é o mesmo que ficar o país entregue a uma quadrilha de falsários. Êles desandam a emitir sem conta nem limite, o dinheiro se multiplica tanto que vira papel sujo, e o que ontem valia mil, hoje não vale mais zero.
Não preciso explicar muito êste capítulo, já que nós ainda nadamos em plena inflação e sabemos à custa da nossa fome o que é ter moedeiros falsos no poder.
Escolhem-se nas eleições aquêles que têm direito de demitir e nomear funcionários, e presidir a existência de todo o organismo burocrático.
E, circunstância mais grave e digna de todo o interêsse: dá-se aos representantes do povo que exercem o poder executivo o comando de tôdas as fôrças armadas: o exército, a marinha, a aviação, as polícias.
E assim, amigos, quando vocês forem levianamente levar um voto para o Sr. Fulaninho que lhes fêz um favor, ou para o Sr. Sicrano que tem tanta vontade de ser governador, coitadinho, ou para Beltrano que é tão amável, parou o automóvel, lhes deu uma carona e depois solicitou o seu sufrágio - lembrem-se de que não vão proporcionar a êsses sujeitos um simples emprêgo bem remunerado. Vâo lhes entregar um poder enorme e temeroso, vão fazê-los reis; vão lhes dar soldados para êles comandarem - e soldados são homens cuja principal virtude é a cega obediência às ordens dos chefes que lhe dá o povo. Votando, fazemos dos votados nossos representantes legítimos, passando-lhes procuração para agirem em nosso lugar, como se nós próprios fôssem. Entregamos a êsses homens tanques, metralhadoras, canhões, granadas, aviões, submarinos, navios de guerra - e a flor da nossa mocidade, a êles prêsa por um juramento de fidelidade. E tudo isso pode se virar contra nós e nos destruir, como o mostro Frankenstein se virou contra o seu amo e criador.
Votem, irmãos, votem. Mas pensem bem antes. Votar não é assunto indiferente, é questão pessoal, e quanto! Escolham com calma, pesem e meçam os candidatos, com muito mais paciência e desconfiança do que se estivessem escolhendo uma noiva. Porque, afinal, a mulher quando é ruim, dá-se uma surra, devolve-se ao pai, pede-se desquite. E o govêrno, quando é ruim, êle é que nos dá a surra, êle é que nos põe na rua, tira o último pedaço de pão da bôca dos nossos filhos e nos faz aprodecer na cadeia. E quando a gente não se conforma, nos intitula de revoltoso e dá cabo de nós a ferro e fogo.
E agora um conselho final, que pode parecer um mau conselho, mas no fundo é muito honesto. Meu amigo e leitor, se você estiver comprometido a votar com alguém, se sofrer pressão de algum poderoso para sufragar êste ou aquêle candidato, não se preocupe. Não se prenda infantilmente a uma promessa arrancada à sua pobreza, à sua dependência ou à sua timidez. Lembre-se de que o voto é secreto.
Se o obrigam a prometer, prometa. Se tem mêdo de dizer não, diga sim. O crime não é seu, mas de quem tenta violar a sua livre escolha. Se, do lado de fora da seção eleitoral, você depende e tem mêdo, não se esqueça de que DENTRO DA CABINE INDEVASSÁVEL VOCÊ É UM HOMEM LIVRE. Falte com a palavra dada à fôrça, e escute apenas a sua consciência. Palavras o vento leva, mas a consciência não muda nunca, acompanha a gente até o inferno”.
"Sou pela liberdade.Pelas concessões ideológicas.Eu acho que o voto do analfabeto foi um dos maiores erros políticos,um instrumento de demagogia,de rebaixamento político, o voto dos analfabetos". Raquel de Queiroz

4 comentários:

  1. É demagógica nossa realidade até!
    Me parece que o voto nunca foi ou será consciente....responsável...sem interesse.
    Por isso creio que devo votar em quem confio...mesmo sabendo que ele jamais ganhará...tenho que seguir meus parãmetros de cultura, educação....política verdadeira!
    Será que um dia vamos conseguir deletar certos estigmas desse povo alegre, sofrido...mas surdo e mudo...??

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  2. Olá C.Montovani,concordo com você ,portanto creio que,em alguma época ainda veremos tudo com transparência.Acreditoem nós,povo brasileiro e penso que ouvidos e olhos se abrirão para receber a verdadeira política ,com Homens honrados,nos quais poderemos confiar sem pestanejar.Acredito também que a honestidade sempre estará conosco e,que poderemos passá-la aos demais .Obrigada pela sua visita e comentário que veio enriquecer o Naco de Prosa.

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  3. Marli,
    Ao caminhar por essas ruas virtuais, encontrei a tua casa de letras aberta, e entrei. Voltarei, fique certa, ainda que estejamos nos extremos do país, pois o ato de escrever, que torna todos nós grandes, tem essa propriedade.
    Quando puder, leia os meus romances, eles estão disponíveis inclusive através de formato PDF.
    Um abracão!

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  4. João,
    Fiquei muitíssimo feliz ao ver que você encontrou o endereço deste humilde,porém nobre e sábio recinto.Honrada por ter recebido a visita de tão ilustre pessoa,um escritor.Vou ler com certeza, suas obras e talvez isso faça com que eu retome meus escritos também.Um abraço!

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